sexta-feira, 22 de maio de 2009

Shakespeare



"If you prick us, do we not bleed?
If you tickle us, do we not laugh?
If you poison us, do we not die?
And if you wrong us, shall we not revenge?"

Merchant of Venice

"And therefore as a stranger give it welcome.
There are more things in heaven and earth, Horatio,
Than are dreamt of in your philosophy."


Hamlet

"O Romeo, Romeo, wherefore art thou Romeo?
Deny thy father and refuse thy name;
Or if thou wilt not, be but sworn my love
And I'll no longer be a Capulet"


Romeo and Juliet

"Love is not love
When it is mingled with regards that stand
Aloof from the entire point"


King Lear

quarta-feira, 22 de abril de 2009

Considerações sobre a fidelidade



Depois de ler vários absurdos na internet, escutar (as vezes calado e perplexo) a propagação indiscriminada de teorias mirabolantes que visam justificar a infidelidade como comportamento aceitável e até mesmo saudável e importante em relacionamentos adultos, resolvi tecer algumas considerações pessoais sobre o tema. Mais estranho é como eu ainda consigo me estarrecer perante os absurdos cada vez mais constantes que tomam conta da nossa sociedade atualmente. Me entristece ainda saber como o capitalismo conseguiu mercantilizar o sexo e o amor a ponto de equipará-los a coisas extremamente banais como uma roupa ou um carro, ou outro objeto de consumo rápido e pronto. Nada mais atraente ao consumidor que a pseudo-liberdade de se relacionar com quantas pessoas lhe despertem o desejo, podendo assim se afirmar como um consumidor de alto nível, de várias posses. O homem que trai se sente capaz, dotado do poder de consumir quantas mulheres sejam necessárias a lhe alçar a condição de super-homem frente ao seu ciclo de amigos consumistas também. A mulher, iludida pela ideia de igualdade de direitos, acredita se afirmar com a mesma prática. Se sente mais desejada e mais liberada quando se atira a relacionamentos extra-conjugais. E traem-se uns aos outros, na reprodução indefinida do nada, da abstinência sentimental em troca do consumo efêmero, hedonista, imediato de outro nada, do sexo casual. Seria fácil definir a infidelidade como falha de caráter, pois o é! Mas vale fazer uma análise um pouco mais profunda, mesmo que ainda não muito. Evidentemente fidelidade e amor são coisas distintas, pois o vínculo de exclusividade não condiciona ao vínculo afetivo e vice-versa. De onde eu vejo, a questão passa pela total perda de respeito pelo outro, pelo individualismo exacerbado, pela concorrência selvagem, pela busca incessante de ser melhor que o outro, de encontrar a felicidade somente na competição. É a sociedade de valores novos, ou da ausência de valores, aonde a única regra é lucrar a qualquer custo, é ter vantagem sempre, é vencer... Não defendo de forma alguma a monogamia por ela mesma, afinal, nada se explica por si mesmo. O que defendo é a honestidade com quem se gosta, de respeitar a própria decisão de ser exclusivo. Ninguém se obriga a isso, é mero ato de vontade. Por isso, infidelidade não é ato de desamor, de forma alguma. É ato de desrespeito, de total desprezo pelo outro, de insegurança e impotência, daqueles que jamais se realizarão como pessoas porque jamais saberão o que é compartilhar, se doar, pelo simples fato de gostar, de respeitar, de admirar alguém. O melhor de tudo isso que a decisão pela fidelidade (que não deveria sequer ser uma decisão) é unilateral. Não depende do outro, é ato puramente pessoal de caráter. Não se é fiel esperando fidelidade, mas porque se julga certo, porque é traço de personalidade. É algo que não existe dentro da esfera vazia em que existe a nossa civilização. Só faz sentido para os que sabem que o mundo é um pouco mais que o consumo.

sábado, 11 de abril de 2009

Promessas

Imperativo ao momento, deixo quem sabe dizer:


Soneto de Fidelidade

De tudo ao meu amor serei atento
Antes, e com tal zelo, e sempre, e tanto
Que mesmo em face do maior encanto
Dele se encante mais meu pensamento.

Quero vivê-lo em cada vão momento
E em seu louvor hei de espalhar meu canto
E rir meu riso e derramar meu pranto
Ao seu pesar ou seu contentamento

E assim, quando mais tarde me procure
Quem sabe a morte, angústia de quem vive
Quem sabe a solidão, fim de quem ama

Eu possa me dizer do amor (que tive):
Que não seja imortal, posto que é chama
Mas que seja infinito enquanto dure


Vinicius de Moraes

sexta-feira, 10 de abril de 2009

Sometimes, sometimes...


Levando em consideração o esforço psicológico absuro que me submeto para fazer valer na prática as coisas que penso, é normal que as coisas assumam dimensões diferentes no meu mundo. Como no final das contas a gente perde mais do ganha, acostumar-se com o sofrimento é normal pra todos os que encontram os abismos da vida, sejam eles de quaisquer natureza. Mas enganam-se aqueles que imaginam que isso nos torna mais tristes, ou depressivos, ou coisa que o valha. São apenas lados de uma mesma realidade, faces de uma mesma moeda. O mesmo sofrimento que se impõe severo por sentirmos mais o mundo, e este mundo é sim um lugar bem frio e vazio, nos proporciona singelos momentos de felicidade singular. Está certo que se pode contar nos dedos tais momentos em uma vida, mas o espetacular de tudo isso é ter a consciência que este momento está acontecendo quando ele realmente está. Sem lamentações posteriores de que deveríamos ter aproveitado mais ou percebido coisas que ignoramos. Claro que as consequências da sua escolha fogem ao seu domínio, mas isso não importa realmente. É o prazer de saber que fazemos sempre o melhor que nós podemos que nos move, que nos faz entender que independentemente do que acontecer, o dia vai nascer de novo amanhã, e a vida vai me trazer novas escolhas, e o caminho sem volta é sempre de decidir o que se acha certo, o que se sente ser certo. Por mais que o mundo real não seja lá dos mais perfeitos, é com certeza muito mais intenso, e viver de ilusões, me desculpem, é para os fracos. A verdade sempre é o caminho mais difícil, e sempre o mais belo, para que os que sabem que como no amor, também há beleza na dor, na experiência única que é viver...

quinta-feira, 9 de abril de 2009

No meio do caminho tinha uma pedra...


Peço desculpas por minha superficialidade no assunto, mas me atrevo a tecer algumas considerações acerca de uma discussão filosófica, talvez a mais relevante do século passado, que diz respeito a liberdade do indivíduo, o conflito básico entre o existencialismo e o marxismo ortodoxo, o papel da individualidade na história. Estamos realmente condenados a sermos livres, como constatou Sartre? Até onde essa liberdade pode ser exercida? A história é realmente uma marcha mecânica de estruturas econômicas somente mutáveis pelo cumprimento de um determinado ciclo social? Inventar o meio termo, sobre bases idealistas, jamais. Deixo esse papel ridículo para incosequentes como Michel Foucalt e sua trupe. Estamos sim condenados a ser livres, em determinado aspecto, vez que existe sempre a opção da escolha em qualquer situação. Mas o homem é um ser social, os fenômenos individuais na raça humana representam sim, fenômenos sociais também. E tendo isso em conta, é impossível não constatar que o meio talha sim, de forma decisiva, a gama de escolhas as quais somos permitidos fazer. A liberdade individual plena existe, mas não pode ser exercida socialmente em sua plenitude, o que causa uma controvérsia dialética natural. A síntese que se constrói a partir desse conflito, infelizmente, até hoje me parece intersubjetiva. E a solução desse problema só passará a ter uma resposta científica real depois do desenvolvimento de ciências que ainda estão limitadas pela universidade burguesa, como a psicologia e a sociologia. Caminhamos a passos muito lentos para a reintrodução do materialismo dialético no campo das ciências humanas e são raros os que se atrevem a enfrentar tal assunto. Enquanto a ciência não nos traz opções, minha tendência é aceitar a indissociabilidade da teoria e da prática e agir sempre de forma a buscar a transformação da realidade, tanto a minha realidade individual e consequentemente através dela a realidade do meio. E aceitar sempre que o desfio é maior do que simplesmente fazer a minha parte. Acho muito lindo o passarinho que quer salvar o incêndio da floresta trazendo água no bico, mas honestamente, a esse papel egoísta visivelmente ineficiente e moralista, eu não vou me prestar, não quero morrer queimado e virar mártir. Quero viver pra transformar.

quarta-feira, 1 de abril de 2009

Humanos


Não sobra muita coisa no que diz respeito a escolha senão o lívre arbítrio. Não se assustem, continuo marxista inveterado, exatamente por isso sustento a afirmação. Afinal, de que valeria a práxis se não pudessemos optar por ela? Evidentemente a pressão pela massficação do pensamento em prol do consumo limita, e muito, o poder da escolha. Mas em momento algum isso servirá de motivo a alguém justificar seus erros ou a sua própria renúncia do raciocínio próprio pela imposição do meio, afinal o meio não é fator uníco na formação da individualidade, a resposta pessoal aos estímulos também é determinante, mesmo que essa resposta venha inconscientemente de fatores sociais também. O que torna tudo interessante nessa geléia psico-social toda, é o caráter falível das nossas decisões, e a beleza do aprendizado constante. Claro que ninguém gosta de sofrer, consequencia fundamental do erro grave em pessoas normais, mas é a delícia da falibilidade que torna a tentativa do acerto tão intensa, inquietantemente insuportável e ao mesmo tempo imperativa aos que não fogem à constante da escolha personalíssima, que não se rendem ao senso comum e que são mais que reprodutores, são produtores e detentores da realidade das coisas. Desta forma, já não me importo mais em sofrer, até mesmo em chorar, não vou me privar em momento algum da adrenalina viciante da incerteza, do medo impulsionador dos devaneios mais racionalmente sentimentais, e se ao final me deparar novamente com a implacável certeza de que sou humano, as lágrimas misturarão tristeza e alegria.

quinta-feira, 26 de março de 2009

Ilusões



Ele nasceu num dia claro, uma manhã comum de um mês de maio qualquer. Nasceu forte, um pouco abaixo do peso mas saudável. Parecia uma criança normal. Era o terceiro filho de uma família de classe média, nasceu de cesariana no hospital mais conceituado da capital. Teve uma infância normal, sem problemas financeiros na família, sem problemas de saúde (tirando uma tia doida que já havia sido internada diversas vezes), sem maiores preocupações. Fez o jardim num colégio privado da zona sul, a poucas quadras de sua casa. Tinha amigos e colegas que frequentavam sua casa e vice-versa. Assistia desenhos pela manhã e estudava à tarde, fazia futebol a noite e inglês uma vez por semana, isso ainda aos 6. Era uma criança extremamente feliz e contagiava a todos ao seu redor. Parecia maduro demais pra sua idade e ao mesmo tempo completamente descontraído e e alegre, aceitava sempre o que lhe acontecia de bom grado, sem os mimos e pirraças típicos da idade e da classe social. Tinha tudo pra ser o mais bem-sucedido da família, desde pequeno se enxergava em seus olhos um brilho e uma inteligência singular. Resolvia problemas de forma espantosamente simples e esbanjava cognição para uma criança daquela idade. Sua vida mudou precisamente aos 9 anos de idade, no mês de julho, férias escolares. Ainda longe de qualquer maturidade afetiva, jamais havia sequer cogitado qualquer envolvimento romantico com uma menina e as odiava por definição, pois, claro, não tinham qualquer aptidão para jogar bola, e brincavam de coisas completamente esdrúxulas como bonecas e casinha. Ele emudeceu. Descia ao térreo do prédio de seu colega para brincar de algo que não me lembro mais, quando avistou a pequena. Ela tinha mais ou menos a sua idade, talvez um ano mais velha, olhos azuis como o céu de julho e cabelos negros como a noite. A pele branca parecia refletir o sol e seu jeito meigo chegava a ser cruel. Não sabia o que fazer, ficou estático, imóvel e só voltou a si depois de que seu colega o atingiu com a bola na cabeça. Passou a tarde a admirar tal anjo. Sim, pois não podia ser apenas uma menina, daquelas que ele odiava, era um anjo, algo divino, inexplicável. Despertou para o amor como um paciente que sai de um coma profundo após 9 anos. Começou a vida ali. A tarde passou e ela se foi. Ao cair da noite, desceu novamente o elevador e se encaminhava para a portaria, para aguardar o motorista que logo chegaria, quando parou no 4 andar. Ela entrou sozinha, e eles se olharam por mais 4 andares, a porta se abriu e num gesto simples ela sorriu e lhe beijou os lábios, de uma maneira infantil, um pequeno estalinho de meio segundo. Se virou e se foi, desta vez pra sempre. Ele jamais esqueceu aquele gesto, foi o combustível de sua vida por vinte anos que se seguiram. Se viciou, se apaixonava constantemente e a alegria de viver agora transbordava, saltava aos olhos, era um romantico incurável. Foi ridicularizado por vezes por seus colegas e amigos, falava de amor já desde os 12 anos. Namorou a menina mais linda do colégio e todas as outras suspiravam quando ele passava. No segundo grau ficou famoso no colégio por dispensar a garota mais popular de todas: simplesmente não a amava. Não era rico, gostava de filosofia mas não tinha barba, adorava o lúdico mas se encantou pela ciência. Fez vestibular pra Medicina e foi aprovado, longe dos primeiros colocados, claro. Teve o primeiro relacionamento adulto aos 20 anos de idade. Como todas as outras, ela era linda, inteligente e tinha como melhor qualidade saber passar horas conversando. Parecia perfeito, foram 3 anos de namoro, ele já estava fazendo residência num hospital grande da capital, era aluno de destaque e ninguém duvidava do futuro brilhante que o rapaz teria pela frente. A família só falava dele, dos prêmios que recebera, da linda menina que iria se casar, do equilíbrio emocional singular, da coragem e liderança do rapaz. Foi numa sexta-feira quente de dezembro, festa do final do ano do pessoal do hospital, acompanhado de sua noiva que aconteceu algo anormal. Alcançava um copo de cerveja da bandeja do garçon que viu de longe a menina dos olhos. Continuavam azuis. O mundo se fez em um silêncio ensurdecedor. Não via nada a sua frente e não ouvia ninguém a sua volta. Virou-se novamente pra sua acompanhante e não sentiu nada. Aquela moça com que estava disposto e ansioso a passar o resto de sua vida agora já não lhe despertara sequer compaixão. Um mar de indiferença que ele jamais havia experimentado se apoderou do seu corpo e de sua alma, como se o amor fosse um líquido que tivesse escorrido em alguns segundos pelo ralo da pia. Nem ao menos chorou. Disse a ela, como se pedisse um café em um bar qualquer, que não a amava mais, que não suportaria mais passar um segundo de sua vida ao lado dela. Não se falava de mais nada em seu meio. Como e porque ele fez aquilo. O homem já não era mais tão doce como o garoto, já não era feliz, já não amava ninguém, era rude com os que lhe cercavam e destratava sua família. Não completou a residência: foi expulso do hospital por agredir um paciente que se recusava a tomar um remédio. Se afundou em livros. Procurou psicólogos e psiquiatras. Queria saber porque não sentia mais nada. Seria possível que houvesse gastado todo o sentimento de sua vida nos primeiros 24 anos, e agora era incapaz de sentir? Ou foi a lembrança de um amor tão simples, tão infantil, que havia estraçalhado a realidade fútil de sua vida adulta? Só havia uma solução. Precisava encontrar aquela moça. Fez contatos com amigos e descobriu quem a havia levado àquela festa, por coincidencia era primo de um grande amigo seu. Conseguiu seu telefone e teve coragem de ligar. Ela se lembrava dele sim, com detalhes, e aparentemente aquele beijo havia marcado também a vida dela. Se encontraram e ele reencontrou a felicidade. Se reapaixonaram como se nunca houvessem se afastado, se amaram como se fosse donos do amor do mundo, se entregaram um ao outro como se não houvesse amanhã. Ele voltou a faculadade e concluiu a residência, se tornou médico importante e abastado. Ela era psicóloga, não era famosa mas tinha consultório próprio e gozava de algum respeito entre a elite. Não esperaram dois anos e já estavam casados, com um filho a caminho. O sinal fechou e ele não viu, a caminhonete o pegou de lado e ele desmaiou instantâneamente. Acordou no hospital, sem o braço esquerdo, o olho esquerdo e com várias cicatrizes no rosto e no corpo. Foi aposentado por invalidez e recebia um salário miserável da previdência. Suas economias e as da família se esvaíram em tratamentos pós operatórios, para conter a dor e evitar hemorragias ou derrames. Sua esposa não trabalhava mais tanto pois precisava cuidar dele, que ensejava cuidados especiais, e do recém-nascido. Já morava agora num dois quartos na Zona Leste, não ia mais a restaurantes chiques nem frequentava as festas da elite. Aos poucos já não via mais na sua esposa a paixão de antes. Era mais uma enfermeira ou coisa que o valha. Começou a se tornar independente novamente, já podia ajudar na casa, a cuidar da criança, mas jamais voltaria a clinicar. Estava fadado à mediocridade, mas se contentava com o amor da mulher e do filho. A moça já apresentava sinais do cansaço, a beleza de antes já não era tão reluzente e o marido nem de longe lembrava mais a imagem do moço por quem se apaixonou por duas vezes, era apenas um aleijado ao qual devia cuidados, não por amor, mas por conveniência, diria que até por pena. Não apresentou muita resistência quando o jovem fisiologista da clínica começou a flertar com ela, era alguns anos mais jovem, independente financeiramente e esbanjava a vitalidade extirpada de seu marido-fardo. Conscientemente tratou de se engravidar do rapaz, e exigiu com autoridade que ele assumisse a criança. Era uma sexta-feira tão quente como aquela de dezembro quando ele se apaixonou novamente por ela, mas dessa vez chovia e muito. Ela entrou em casa molhada, se dirigiu a ele, que assistia televisão no sofá da sala, com a mesma indiferença e desamor com que ele dispensara a ex-noiva 5 anos atrás, proferiu-lhe a sentença do resto de sua vida, ele mudo, não respondeu. Ela apanhou algumas mudas de roupa do armário, arrumou a criança e se foi, não sem avisar antes que mandaria alguém para buscar o resto de suas coisas. Meses depois ele foi condenado a pagar pensão ao seu filho e vivia agora praticamente de um salário mínimo. Via o filho uma vez por mês, por algumas horas, e este já chamava o padastro de papai com mais intimidade que a ele mesmo. Voltou a casa da mãe e morreu sentado em sua cadeira aos 32 anos de idade. Há três já não sentia mais o mundo. Não conseguia nem por um segundo sentir qualquer tipo de emoção em qualquer tipo de situação. Dizem que morreu de tristeza, mas não é verdade. Não poderia se atribuir a ele sentimento tão intenso. A certidão de óbito dizia "falência múltipla de órgãos", o que muitos atribuiam, também errôneamente, aos maus fins do acidente. A verdade é que os órgãos que faliram enfim, há algum tempo perderam a razão de funcionar. Pulsavam dentro de um corpo desprovido de qualquer alma. Em determinado momento se lembrou daquele dia de julho, 23 anos atrás, quando descobrira o amor. Teve consciencia então que a coisa mais sublime pela qual se era digno viver não passava de uma ilusão infantil, que se vivia até a idade adulta e alguns até a velhice. Deciciu morrer naquele momento porque chegou à verdade antes da hora, desmistificou a beleza da vida e não vislumbrou algo mais a se viver por. Fechou os olhos como se fosse dormir e deixou pra trás a amargura de saber que nos preenchemos todos de um vazio sem esperanças de se preencher, senão por ilusões.