sexta-feira, 24 de junho de 2016

Temer, Trump, Farage e a esquerda

A saída do Reino Unido da União Europeia é, até agora, a consequência mais "grave" da crise do capital, eclodida em 2008 e até o momento não superada. Não somente pelas consequências econômicas advindas desse processo, mas, principalmente, pelo avanço do nacionalismo radical na Europa. Desde a queda do muro do Berlim, em 1989, a "esquerda" vem, gradualmente, se afastando do campo da política e da economia para se tornar tão somente uma categoria da estética, sem apresentar quaisquer soluções às cíclicas crises capitalistas. O afastamento do marxismo criou fértil terreno ao crescimento do "socialismo burguês" e suas diversas faces. Encampada pelo pós-modernismo, a "esquerda" passou a dedicar-se tão somente a pontuais problemas sociais, afastando-se de suas causas. Daí o crescimento dos movimentos de igualdade racial, de gênero, de orientação sexual, o veganismo e outros movimentos em prol do bem-estar animal, o ambientalismo, a defesa intransigente do assistencialismo estatal (como se não fosse o estado capitalista, em primeira e última instância, o responsável pela desigualdade) entre outras bandeiras vazias de significação econômica, reafirmadoras da viabilidade do capitalismo.
Por outro lado, a direita e a extrema direita vêm, sistematicamente, denunciando a inviabilidade do projeto da "esquerda" para solução das crises econômicas. A razão assiste a este último grupo, uma vez que a história prova em largo lastro que o capitalismo é irreformável em prol do trabalhador. A burguesia não negocia, é intransigente e absolutamente determinada a manter e a ampliar constantemente suas taxas de lucro. Os parcos benefícios concedidos à classe trabalhadora permanecem, unicamente, nos períodos de crescimento econômico em que tais dispêndios estatais não comprometem a acumulação.
Como diria Mauro Iasi, não existe uma nova direita. Ela sempre esteve aí, aguardando o acirramento das condições sociais de sobrevivência para assumir seu lugar histórico. E a ascensão de figuras como Nigel Farage, Donald Trump e Michel Temer são apenas reflexos do aprofundamento da crise e da incapacidade da esquerda em apresentar soluções, porque, obviamente, não as tem.
De certo que o PT, o Partido Trabalhista na Inglaterra e o Partido Democrata nos EUA não poderiam, em outras épocas, serem considerados partidos de esquerda. Mas o espectro político se move radicalmente à direita, ao passo em que a esquerda se afasta do marxismo. Por este motivo, é didático assumir que a atual esquerda mundial se enxerga representada nesses grupos políticos anti-revolucionários.
Lembremos que o nazi-fascismo surgiu em condições extremamente similares às atuais, pós-crise de 1929 e com o sofrimento do povo italiano e alemão face às restrições impostas pelo Tratado de Versalhes. O ressurgimento do nacionalismo não é uma coincidência ou uma particularidade do momento atual. É histórico e esperado. A burguesia faz com habilidade o redirecionamento dos problemas que ela mesmo causa. Judeus, comunistas, imigrantes, negros, miseráveis, mexicanos, políticos, enfim, toda e qualquer categoria a qual se possa concentrar esforços para desviar a insatisfação do trabalhador. Este trabalhador, como sabemos, tende antes à reação que à revolução. É uma tendência não apenas ideológica. A neurociência confirma que os seres humanos tendem a aceitar soluções cognitivamente mais simples. Por isso o sucesso de discursos que parecem infantis para a "esquerda". Não há nada de infantil, nem de ingênuo no discurso da direita. A burguesia confia na ignorância do trabalhador, pois é sua patrocinadora.
O que é particular do momento atual é a ausência da alternativa a esse movimento. Se na década de 30 tínhamos uma URSS sólida e o surgimento de países socialistas, hoje não temos nada.
Aos marxistas, urge a ruptura imediata com esse bloco reformista pró-capital e a radicalização do discurso, apresentando-se como única solução possível ao problema econômico mundial.
Mas a preocupação de alguns "marxistas" pós URSS é de mera masturbação mental. Se não existe prática revolucionária sem teoria revolucionária, o contrário também não se sustenta. É preciso ser mais panfletário e menos acadêmico. Qualquer débil mental lê e compreende o Manifesto Comunista. E, ao contrário, estamos fazendo complexas releituras da interpretação Marcuseana sobre as instâncias da psiquê humana, confortavelmente sentados nas salas da universidade burguesa.
É evidente que temos uma enorme contribuição teórica de inúmeros filósofos pós-Marx e pós-Lenin, mas esse conhecimento deve ser utilizado para apresentar soluções ao trabalhador, não à academia. Esquecemos que é apenas o proletário o sujeito capaz de revolucionar? E esquecemos que filósofos interpretaram o mundo de diversas formas mas a questão, entretanto, é transformá-lo?
É hora do basta. Do não às causas trabalhistas, do não a barganha de direitos, do não às conquistas parciais, do não à conciliação. Lembremos de Gotha, libertemo-nos do lassaleanismo o quanto antes. A direita avança quilômetros enquanto nos arrastamos por centímetros.
Ou avançamos sobre eles ou seremos atropelados. A história não mente.

terça-feira, 18 de agosto de 2015

Epitáfio


Não me arrependo de nada,
Nem de estar aqui
Na vida não ganhei muito
E foi muito o que perdi

Não vi tudo que queria
Nem quis tudo que vi
Me encantei com algumas coisas
Alguns momentos que vivi

Foram poucos os segundos
Dos quais nunca esqueci
Menos ainda as pessoas
As quais quis aplaudir

Fui igual a todo mundo
Prova disso é que morri
Não sorri mais que ninguém
Mas um pouco mais sofri

Não me orgulho de nada
Pois nada consegui
Até amei uma vez
Nem do amor eu me escondi

Não tenho nada a ensinar
Não gostei de nada que li
Mas me envergonho e muito
Das porcarias que escrevi

Houve uma vez entretanto
Em que totalmente me perdi
Perdido então num segundo
O resto da vida cumpri

Não contei a vida em anos
Mas em coisas que senti
Por isso fui eterno
Em muitos me dividi

Não tenho nenhum conselho
Só uma coisa eu aprendi
O que vale a pena é o caminho
Que se faz até aqui

quarta-feira, 25 de agosto de 2010

Democracia

DEMO = DIABO
CRATOS = PODER

Democracia é o poder nas mãos do Diabo. E ele até zomba com a nossa cara. Contou pra alguém, que espalhou a notícia, que esse demo vem do grego "povo".

Vem nada, foi ele mesmo quem colocou essa merda na terra.

terça-feira, 24 de agosto de 2010

O outro lado

Quando eu morrer, não quero ir para o céu
Vai que eu descubro que Deus existe?
Me mato de novo e me cubro com um véu
Não consigo imaginar cena mais triste

Deus me olhando com ar de compaixão
Dizendo que eu devia pedir-lhe perdão
Eu diria: "Perdão peça tu,
que vê o povo sofrendo, tomando no cu"

Palavrão lá céu com certeza é pecado
Mas descer pro inferno
Deve ser arriscado
Já sabemos que o mundo
Também é do diabo

Mas se penso um pouquinho
Eu me mato de novo
Entre Deus e o Diabo
Quem se fode é o povo.



sexta-feira, 5 de fevereiro de 2010

Chávez é um inimigo da liberdade de imprensa?


Os venezuelanos têm hoje um cardápio de jornais, revistas e meios audiovisuais mais amplo e plural que em qualquer momento de sua história. Organizações sociais e comunidades tiveram apoio para romper a ditadura do poder econômico e criar novos veículos.

As punições recentemente adotadas contra a RCTVI (Rede Caracas de Televisão Internacional) e outros cinco canais a cabo suscitaram forte onda acusatória contra o presidente venezuelano. Um aluvião de artigos e editoriais foi lançado a público para acoimá-lo como inimigo da liberdade de imprensa.

A mídia conservadora, como é de seu feitio, embaralha as informações para melhor articular sua escalada contra Chávez. Os motivos que levaram às medidas punitivas são omitidos ou manipulados. O vale-tudo não tem compromisso com a verdade.

Os seis canais suspensos violaram seguidamente vários dispositivos legais (obrigatoriedade de transmitir redes oficiais, programas educacionais, símbolos nacionais, classificação etária e assim por diante). Três entre esses reconheceram as irregularidades e se comprometeram a retificá-las: voltaram imediatamente ao ar. Os demais têm a mesma possibilidade. Nenhum canal foi fechado ou desapropriado.

Até mesmo alguns setores progressistas, porém, ficaram abalados com esses fatos. Muitas pessoas de bem, afinal, reagem como se o tema da liberdade de imprensa fosse sagrado. Desses sobre os quais só pode haver uma opinião possível: as demais seriam autoritárias ou, quando muito, ultrapassadas.

O dogma criado pela plutocracia midiática associa uma robusta bandeira democrática com a apropriação privada dos meios para realizá-la. Liberdade de imprensa, para esses senhores e senhoras, é o direito ilimitado dos proprietários de veículos de comunicação em usufruir a bel-prazer de seus ativos de informação e entretenimento. Qualquer contestação ou regulação dessa franquia quase divina constituiria uma ameaça à democracia.

Mas o que há de democrático na transformação de um bem público (o direito de informar e ser informado) em monopólio de corporações privadas, famílias ou indivíduos? Qual é a liberdade possível quando os instrumentos de comunicação e cultura têm seu controle originado no poder econômico?

A revolução técnico-científica das últimas décadas fez da informação e seus meios um poder fático. Sua expansão foi patrocinada por governos e grupos empresariais, cuja associação direta ou indireta com os donos dos veículos alavancou esse baronato a um papel político, cultural e econômico de ampla envergadura.

Basta um olhar ligeiro sobre a América do Sul para termos noção desse processo. Quase todas as empresas relevantes de comunicação foram criadas ou fortalecidas pelas ditaduras e seus sócios capitalistas. Os casos Clarín e Globo, mais conhecidos, estão longe de ser exceção. Na Venezuela a história não foi diferente.

A democratização do subcontinente, no entanto, jamais chegou aos meios de comunicação. Está certo que acabou a censura, mas os barões da mídia só viram sua influência e autonomia crescerem. A liberdade formal de qualquer grupo social ou indivíduo em criar seu próprio veículo foi implantada, de fato, mas a possibilidade econômica de exercer essa prerrogativa continuou nas mesmas e poucas mãos.

Os interesses nessa autonomia, no mais, vão além dos proprietários dos meios, abençoados pelas condições institucionais de difundir livremente os valores, idéias e informações que melhor lhes apetecer para a lucratividade de seu negócio.

Seu estatuto especial, o de único poder público de caráter privado, permitiu a plena realização do diagnóstico anunciado pelo pensador italiano Antonio Gramsci, há mais de setenta anos, quando afirmou que os jornais haviam se transformado nos “modernos partidos políticos da burguesia”.

Os meios monopolistas de comunicação podem se exibir como neutros, objetivos ou isentos, com verniz de interesse universal que nenhuma agremiação conservadora teria como apresentar aos eleitores. Chegam à desfaçatez de alcunhar o que editam ou difundem de “opinião pública”, como se a sociedade tivesse delegado a esse setor social uma procuração para falar em seu nome.

Mas não se trata apenas de aparência. Através dos meios um exército profissional de colunistas, jornalistas e produtores de entretenimento, entre outros, pode ser integralmente mobilizado para construir os valores e as informações que correspondem aos interesses de seus patrões e associados. Esses veículos cumprem a tarefa de articular o discurso e a base social das elites ao redor das quais gravitam.

Sua atividade, ao contrário das demais funções públicas, incluindo os partidos políticos, não está subordinada a qualquer mecanismo eleitoral, controle social ou fiscalização institucional, ainda que os meios audiovisuais – a ponta de lança do sistema comunicacional – operem quase sempre a partir de uma concessão do Estado.

O que esse baronato chama de “liberdade de imprensa” é de um cinismo exemplar. Trata-se apenas da sua liberdade de imprimir, difundir e entreter, às custas da negação prática desse direito a imensos grupos sociais, que não possuem os instrumentos institucionais e as possibilidades financeiras de levar a público sua própria voz.

A eleição de governos progressistas na América Latina criou a chance dessa situação antidemocrática ser superada ou, ao menos, amenizada. A presidente Cristina Kischner, na Argentina, conseguiu a aprovação de uma nova lei para os meios audiovisuais. O boliviano Evo Morales segue pelo mesmo caminho. O líder venezuelano, atropelado em 2002 por um golpe de estado urdido e animado pelos grandes meios de comunicação, foi quem primeiro ousou agarrar o touro pelos chifres.

Nenhum desses governantes propôs que fosse estabelecida alguma espécie de censura ou impedimento para a circulação de idéias. Ao contrário: suas iniciativas buscam restringir o peso dos monopólios, abrindo espaços para novos atores e regulamentando uma atividade tão estratégica para a sociedade.

Trata-se, aliás, de uma abordagem comum à maioria dos países democráticos, nos quais existem leis que limitam esses monopólios, asseguram produção nacional e programação educacional, estabelecem cláusula de consciência para os jornalistas, abrem espaço para os movimentos sociais e sindicais.

Mas a reação do baronato venezuelano, no caso específico, não se fez por esperar. Vários dos proprietários desses meios simplesmente se recusam a obedecer legislação proposta por um governo eleito pelo povo e aprovada por um parlamento legítimo. As punições que receberam foram a conta justa, e bastante moderada, para quem insiste em andar fora da lei, costume inconcebível em uma democracia.

Os monopólios estão sendo regulamentados, como é adequado a qualquer serviço público, sob o risco de perderem a concessão que receberam caso persistam em atitudes antidemocráticas. Poderiam ter sido cassados há oito anos, quando foram protagonistas da intentona golpista, mas lhes foi conferida a oportunidade de revisarem suas opções.

Os venezuelanos têm hoje um cardápio de jornais, revistas e meios audiovisuais mais amplo e plural que em qualquer momento de sua história. Muitas organizações sociais e comunidades tiveram apoio governamental para romper a ditadura do poder econômico e criar as condições materiais para o surgimento de novos veículos.

Além de manter abertas as portas da imprensa oposicionista, apesar de suas recorrentes violações constitucionais, o governo Chávez deu vida a uma importante rede de rádios comunitárias, facilitou a criação de novos canais de televisão, direcionou a publicidade estatal para jornais e revistas independentes. Não é pouca coisa.

O presidente venezuelano, de fato, não se revela amigo da mesma liberdade de imprensa apregoada pela plutocracia midiática. Presta serviço às idéias democráticas, no entanto, ao identificar no monopólio privado e desregulamentado da comunicação o maior obstáculo para o direito de informar e ser informado.


Breno Altman é jornalista, diretor do site Opera Mundi (www.operamundi.com.br)


Retirado de http://www.cartamaior.com.br/templates/colunaMostrar.cfm?coluna_id=4536&boletim_id=642&componente_id=10735

sexta-feira, 22 de maio de 2009

Shakespeare



"If you prick us, do we not bleed?
If you tickle us, do we not laugh?
If you poison us, do we not die?
And if you wrong us, shall we not revenge?"

Merchant of Venice

"And therefore as a stranger give it welcome.
There are more things in heaven and earth, Horatio,
Than are dreamt of in your philosophy."


Hamlet

"O Romeo, Romeo, wherefore art thou Romeo?
Deny thy father and refuse thy name;
Or if thou wilt not, be but sworn my love
And I'll no longer be a Capulet"


Romeo and Juliet

"Love is not love
When it is mingled with regards that stand
Aloof from the entire point"


King Lear

quarta-feira, 22 de abril de 2009

Considerações sobre a fidelidade



Depois de ler vários absurdos na internet, escutar (as vezes calado e perplexo) a propagação indiscriminada de teorias mirabolantes que visam justificar a infidelidade como comportamento aceitável e até mesmo saudável e importante em relacionamentos adultos, resolvi tecer algumas considerações pessoais sobre o tema. Mais estranho é como eu ainda consigo me estarrecer perante os absurdos cada vez mais constantes que tomam conta da nossa sociedade atualmente. Me entristece ainda saber como o capitalismo conseguiu mercantilizar o sexo e o amor a ponto de equipará-los a coisas extremamente banais como uma roupa ou um carro, ou outro objeto de consumo rápido e pronto. Nada mais atraente ao consumidor que a pseudo-liberdade de se relacionar com quantas pessoas lhe despertem o desejo, podendo assim se afirmar como um consumidor de alto nível, de várias posses. O homem que trai se sente capaz, dotado do poder de consumir quantas mulheres sejam necessárias a lhe alçar a condição de super-homem frente ao seu ciclo de amigos consumistas também. A mulher, iludida pela ideia de igualdade de direitos, acredita se afirmar com a mesma prática. Se sente mais desejada e mais liberada quando se atira a relacionamentos extra-conjugais. E traem-se uns aos outros, na reprodução indefinida do nada, da abstinência sentimental em troca do consumo efêmero, hedonista, imediato de outro nada, do sexo casual. Seria fácil definir a infidelidade como falha de caráter, pois o é! Mas vale fazer uma análise um pouco mais profunda, mesmo que ainda não muito. Evidentemente fidelidade e amor são coisas distintas, pois o vínculo de exclusividade não condiciona ao vínculo afetivo e vice-versa. De onde eu vejo, a questão passa pela total perda de respeito pelo outro, pelo individualismo exacerbado, pela concorrência selvagem, pela busca incessante de ser melhor que o outro, de encontrar a felicidade somente na competição. É a sociedade de valores novos, ou da ausência de valores, aonde a única regra é lucrar a qualquer custo, é ter vantagem sempre, é vencer... Não defendo de forma alguma a monogamia por ela mesma, afinal, nada se explica por si mesmo. O que defendo é a honestidade com quem se gosta, de respeitar a própria decisão de ser exclusivo. Ninguém se obriga a isso, é mero ato de vontade. Por isso, infidelidade não é ato de desamor, de forma alguma. É ato de desrespeito, de total desprezo pelo outro, de insegurança e impotência, daqueles que jamais se realizarão como pessoas porque jamais saberão o que é compartilhar, se doar, pelo simples fato de gostar, de respeitar, de admirar alguém. O melhor de tudo isso que a decisão pela fidelidade (que não deveria sequer ser uma decisão) é unilateral. Não depende do outro, é ato puramente pessoal de caráter. Não se é fiel esperando fidelidade, mas porque se julga certo, porque é traço de personalidade. É algo que não existe dentro da esfera vazia em que existe a nossa civilização. Só faz sentido para os que sabem que o mundo é um pouco mais que o consumo.